terça-feira, 29 de março de 2011

Oblíquo Cristal

Estaremos mais fortes depois do último dilúvio. Quando tudo terminar seremos a última fronteira da resistência, o final da medida certa. Fazer o fim parecer o meio, eu no túnel de fumaça escura, densa e intransponível. Assisto ao início do fim andando em ruínas tortas de um futuro cinza. Quero pular pela janela da indecisão, cair em solo de fraqueza porém rodeado por liberdade. Liberdade cinza. Fosca. Triste. Estaremos mais fortes depois do último dilúvio. Não se preocupe meu amor. Meu amor não vai te deixar. Meu amor já me deixou. Deixou um corte de cristal oblíquio. Do olhar de dinamite dela. Fugor voraz de dinamite cega. Que dilacera. Esquarteja. O sonho de desejos tortos. A terceira esquina do país perdido, a última sina do amor fracassado é tentar se esconder mais uma vez. Dessa vez mais fundo, mais sozinho, mais com menos. Com mais amplidão. Com mais intensidade. Insensato coração. Coyotes na froteira atômica. Fugindo do inesperado. Odiando com mais amor. Estarei mais forte depois do último dilúvio. Oh paz sagrada de um mundo sem sentido. Melhor que estar perdido é estar perdido sem razão. Pra que flutuar no futuro incerto, se temos a chama de um balançar de pernas sensuais. Fogo. Suor. Fogo, suor. Fogo. Suor. Cristais rasgando a pele suada. Esquisito não é andar sem rumo. Esquisito é ter o rumo e não andar. Não amar de verdade. Amar o dinheiro. Ame o dinheiro, "Deus numa nota de cem." esquisito é não ir. Somos esquisitos. Eu sou um elefante verde. "A insustentável leveza do elefante verde." Sinônimos andam de mãos dadas, explicam a falta de amor, explicam a dança das palavras. Mas não me servem de nada. Se não estou agora aqui. Se estou longe demais de mim. Estarei mais forte depois do último dilúvio. Por tudo que está perdido. Por tudo em que ainda vou me perder. Passamos a andar mais traquilos. Passamos a escurecer. Emudecer. Cristais cortando o silêncio. Silêncio de um uivo ancestral. Nossa vontade ancestral. Nossa saudade ancestral. Saudade de tudo que nunca vamos ter. A última fronteira, cruze a linha. Ruídos, sussurros, sangue e morte na fronteira atômica. Bombas na Líbia. Bombas nos meus sonhos. Bombas nos olhos dela. Gatilho. Lá se vai mais uma esperança dançando nua num painel branco de destruição. Mas ela dança e zomba de todos nós. Atônitos sobre a tela de cinema em branco. Esperando mais uma sessão. Sessão de dor. Sessão da tarde. Sessão de azul do céu. Céu vermelho de histórias tristes. Tristeza santa de um olhar morto. Morto na paisagem viva. Vivo na natureza morta. Morto como os sonhos. Morto como a morte. Matando a morte para fugir da dor. Matando a morte para correr da dor. Sorrir da dor. Que sorri da morte. Que sorri de mim. A dor que arde e mata a morte. Morri de amor. E o amor morreu. Estarei mais forte do último Dilúvio. Mesmo que ele nunca chegue. Mesmo que ele não volte mais. Estarei aqui. Infelizmente. Isso é o fato. O fato que destrói as pontes jogando corpos no rio. Joga carros por cima das ondas e destrói uma nação do sol nascente. Estarei no ponto. Pronto para roubar minha vida. Para ir de encontro a mim mesmo. Para destruir meu presente. Pronto para o que eu não sei, nem nunca soube, nem nunca vou saber. Ponto. Eu sou meu mundo de uma nação perdida. Enfim, fim.